segunda-feira, 20 de julho de 2015

Conjuntura:

COMENTÁRIOS SOBRE A PROPOSTA DA CENSURA ESCOLAR




Os projetos de lei apresentados no Congresso Nacional com vistas a criminalizar a "ideologização da escola", inspirados num movimento chamado "Escola sem Ideologia", vem no bojo do crescimento das opiniões reacionárias, preconceituosas e intolerantes que vem ganhando espaço nos últimos tempos, e não só no Brasil. Lincoln Secco respondeu com  maestria aos argumentos esdrúxulos do tal  movimento na edição de 18 de julho do jornal Folha de São Paulo.


No mesmo dia, um dos bonecos de ventrículo da reação, Rodrigo Constantino, publicou em seu blog na (famigerada) revista Veja o que quis ver: que o advogado Miguel Nagib do citado movimento anti-ideologia teria "demolido" os argumentos dos comunistas no mesmo espaço do jornal, e que de fato as crianças seriam vítimas da ideologização promovida pelos professores esquerdistas. 

Como Secco deu conta de responder (com inegável humor) aos pseudo-argumentos, queria apenas reforçar um dos pontos por ele tratado: os preconceitos com os quais as crianças chegam à escola, independentes portanto dos professores. Se esses "pseudo-neutros" fossem honestos, informariam que todas a teorias científicas, por mais rigorosas que sejam, foram inspiradas por uma visão preconcebida dos cientistas. Darwin foi influenciado pelos estudos não só de seu avô paterno, mas de toda a tradição de teologia natural muito comum na Inglaterra dos séculos XVIII e XIX. Buscou pautar-se pelo rigor, mas trazia elementos "ideológicos" de berço. Para não falar de Isacc Newton, cujos estudos de gravitação universal e de mecânica eram inspirados por sua visão religiosa e alquimística.

Quem conhece a realidade da escola hoje, principalmente a pública (que obviamente não é o caso desse movimento contra a tal ideologização), sabe que a tragédia da educação começa bem antes das crianças colocarem os pés na sala de aula. Porque há um círculo vicioso: os pais não só ganham mal, em famílias desestruturadas, sem tradição de leitura ou debates com alguma preocupação crítica. São também (e Secco nos lembrou) doutrinados aprioristicamente pela TV e pelas diversas igrejas, e repassam isso aos filhos. Aqueles que já tiveram a oportunidade de participar de reunião de pais sabe do que falo: alunos violentos e intolerantes aprenderam isso com os pais, que não se incomodam de demonstram essa influência nas citadas reuniões escolares. Então, um professor que busca ensinar tolerância e posições razoáveis na melhor tradição iluminista e que caberiam muito bem na boca de um Voltaire, um John Locke ou um  Adam Smith, são "doutrinadores comunistas"?

A educação, conforme imaginavam pensadores como Jean J. Rousseau, Émile Durkheim ou Fernando de Azevedo, deveria tornar as pessoas aptas a viver democraticamente, convivendo com a diferença e com o dissenso. É curioso que pessoas que se autointitulam liberais sejam as primeiros a exigir a intervenção estatal em forma de censura a uma categoria que, sob todos os pontos de vistas, foi desprestigiada ao longo das últimas décadas neoliberais.

Agnaldo dos Santos

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